A recente decisão da 2ª câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ/MT) trouxe à tona uma questão delicada e complexa: a responsabilidade dos planos de saúde em custear tratamentos para crianças autistas em clínicas não credenciadas. A decisão, que negou o recurso de uma mãe que buscava manter o tratamento de seus filhos em uma clínica onde já haviam estabelecido um vínculo terapêutico, levanta importantes discussões sobre os direitos dos consumidores e as obrigações contratuais das operadoras de saúde.
No caso em questão, a mãe de duas crianças diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) argumentou que a mudança de clínica e de terapeutas poderia prejudicar o progresso terapêutico de seus filhos. Ela defendeu que a quebra do vínculo com os profissionais já conhecidos poderia causar uma regressão no tratamento, violando o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos do consumidor. No entanto, a juíza Ana Paula da Veiga Carlota Miranda, da 3ª vara cível de Rondonópolis/MT, decidiu que o plano de saúde não era obrigado a arcar com os custos de uma clínica não credenciada.
A defesa do plano de saúde baseou-se no contrato, que prevê a possibilidade de reembolso para tratamentos fora da rede credenciada, mas dentro dos valores estabelecidos. A operadora argumentou que já havia credenciado clínicas que oferecem os mesmos tratamentos indicados, mantendo-se dentro dos limites legais e contratuais. A relatora do caso, desembargadora Marilsen Andrade Addario, destacou que, embora o Código de Defesa do Consumidor (CDC) seja aplicável aos contratos de planos de saúde, não se pode obrigar as operadoras a custear tratamentos em qualquer clínica de escolha do consumidor.
A decisão também se apoia no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que é taxativo e exime as operadoras da obrigatoriedade de custear tratamentos não incluídos, exceto em casos específicos. A Lei n. 9.656/98, que regula os planos de saúde, permite que as operadoras direcionem os pacientes para clínicas credenciadas, desde que estas ofereçam os tratamentos necessários.
Embora a decisão do TJ/MT tenha sido desfavorável à mãe das crianças, ela ainda pode optar por manter o tratamento em uma clínica particular, solicitando o reembolso dentro dos limites de preços do plano contratado. Essa situação destaca a importância de um equilíbrio entre a proteção dos direitos dos consumidores e a viabilidade econômica das operadoras de saúde.
Em última análise, a questão central é como garantir que as crianças autistas recebam o tratamento necessário sem comprometer a sustentabilidade dos planos de saúde. É um desafio que requer uma abordagem cuidadosa e equilibrada, considerando tanto os direitos dos pacientes quanto as obrigações das operadoras.